O verdadeiro irmão mais velho


09/08/2019 #Artigos

Jorge apressava-se para chegar à casa da Carina. Ele sabia que outros irmãos da igreja também estariam presentes.

O verdadeiro irmão mais velho

   Jorge apressava-se para chegar à casa da Carina. Ele sabia que outros irmãos da igreja também estariam presentes. Era aquele grupinho de sempre, cuja amizade começou a ser fortalecida no tempo da instrução de confirmandos e da juventude mirim. Caramba, Jorge pensou, já faz 10 anos desde que nos confirmamos!. Ao entrar na casa da sua amiga, Jorge percebeu que era o último a chegar. A Ingride, o Bernardo e o Mikael já estavam lá, também o Toni e a Débora.

   – Boa noite, Jorge, estávamos esperando por você para começarmos nosso estudo. – expressou o pastor Silva em tom alegre e fraterno. Jorge ficou surpreso ao ver que o pastor chegara antes dele. Rapidamente tomou um dos assentos na sala da Carina e abriu a sua Bíblia no texto que o pastor já tinha lhes passado para ler em casa.

   – Pessoal, conforme eu indiquei o texto bíblico para vocês, vamos refletir hoje sobre “o verdadeiro irmão mais velho”, na parábola conhecida como o “filho pródigo”. O pastor Silva também gostava de falar de suas fontes de pesquisa. – Timothy Keller escreveu um livro muito inspirador, o Deus pródigo. Ele mesmo foi influenciado por um sermão que ouviu do Dr. Edmund P. Clowney. Da mesma forma, o estudo de hoje é inspirado nessas obras!

   Aqueles jovens tinham sempre uma grande expectativa por cada estudo bíblico que o pastor ministrava. Ele se esforçava em sua pesquisa bíblica e também em fontes secundárias para oferecer sempre o melhor que podia. Parecia que havia sempre uma grata surpresa, uma sensação de que havia sempre algo novo a aprender, um aspecto não explorado do Evangelho de Jesus. Talvez fosse a isso que seguidamente o pastor fazia menção, “o evangelho das insondáveis riquezas de Cristo” (Ef 3.8), a mensagem da boa notícia, cuja riqueza de compreensão não se esgota. Há sempre uma compreensão mais profunda a ser percebida.

  Jorge tinha essa expectativa nesta oportunidade de estudo. Ele observava com atenção a mesma expectativa no rosto de cada um daqueles participantes. Mesmo ao relerem o texto de Lucas 15.1-3, 11 -30, a história contada por Jesus, na qual o pastor sempre apontava que seria melhor intitulada como “a parábola dos dois filhos perdidos”. Apesar de ser uma parábola conhecida, Jorge sabia que sairia daquele estudo ainda mais impactado pela graça de Deus.

   Como sempre, o pastor expunha o contexto da parábola. Destacou que o evangelista Lucas fazia questão de ressaltar que havia dois grupos de pessoas que se reuniam para ouvir Jesus. Havia os “publicanos e pecadores” e havia o segundo grupo de ouvintes, que era formado pelos “fariseus e mestres da lei”. Na sequência da ambientação histórica, o pastor interrompeu os pensamentos do grupo com uma breve, mas importante aplicação:

   – Meus irmãos, quero de início expor que esses dois grupos estão representados nos dois filhos da parábola que Jesus contou. Os publicanos e pecadores correspondem ao irmão mais novo. Eles não observam as regras, as leis da Bíblia, que os judeus religiosos seguiam. Assim como irmão mais novo, eles “saíram de casa” ao abandonar a moralidade tradicional de suas famílias e da sociedade respeitável. Os fariseus e mestres da lei são representados pelo irmão mais velho. Esse grupo está associado ao cumprimento rigoroso da moralidade como uma maneira de ter a aprovação diante de Deus e poder barganhar com ele. Externamente, você não encontraria pecados na vida desse segundo grupo. Além disso, cada grupo reage de uma forma diferente. O texto diz, no início, que os pecadores se aproximavam de Jesus. Este verbo “aproximavam-se” tem um aspecto progressivo e nos passa a ideia de que a atração dos irmãos mais novos por Jesus era um padrão frequente em seu ministério. Isso deixava o outro grupo muito intrigado, a ponto de reclamarem: “Este recebe pecadores e come com eles”. Fazer uma refeição com alguém, naquele tempo, era uma expressão de aceitação.

   Jorge estava refletindo sobre essa ambientação histórica da parábola. Na verdade, ele ainda não havia feito tal associação entre os dois grupos que se reuniam para ouvir Jesus e os dois filhos. Mas havia lógica nessa aplicação, pois Jesus era um bom comunicador e, certamente, era seu desejo impactar seus primeiros ouvintes dessa história. Mas sobre o que Jorge não havia refletido ainda era a pergunta que o pastor fez ao grupo:

   – Para quem Jesus dirigiu essa parábola?

   Após comentários dos presentes, o pastor os desafiou a pensar:

   – Quero que vocês pensem na possibilidade de Jesus estar dirigindo o ensino dessa parábola ao segundo grupo, formado pelos fariseus e escribas!

   Agora estava ficando interessante, pensou Jorge. O alvo dessa parábola não seria os pecadores rebeldes mas as pessoas religiosas que faziam tudo para obedecer à Bíblia! Estava claro que a parábola tinha duas partes. A primeira parte falando do “filho mais novo perdido”, e a segunda, do “filho mais velho perdido”. Os presentes tinham consciência de que a primeira parte sempre era mais enfatizada e aplicada em todas as mensagens que já ouviram. Mas a expectativa crescia ao tentarem compreender o argumento do pastor de que o alvo de Jesus era o segundo grupo!

   – Irmãos, – enfatizou o pastor – quero que vocês percebam que não apenas o filho mais novo desrespeitou o seu pai, mas também o filho mais velho. Ambas posturas expressam a tentativa que existe no ser humano de obter a sua alegria, satisfação, redenção à sua própria maneira. Não funciona, não resolve. Veremos que Jesus nos oferece a alternativa radical a essas duas posturas.

   A exposição bíblica e os comentários do pastor, então, transcorreram primeiramente sobre o filho mais novo, contrastando sua rebeldia com a postura amorosa do pai. Os ouvintes originais devem ter achado estranho quando o filho fez um breve pedido ao pai: Quero a minha parte na herança. Não porque ele não tivesse direito. Mas a partilha ocorria naturalmente após a morte do pai. Naquele tempo, o filho mais velho sempre recebia o dobro de seus irmãos. No caso de serem dois filhos, o mais novo receberia um terço da herança. Pedir a herança de imediato e com o pai ainda vivo era um sinal de desrespeito muito grande. Era como se desejasse que seu pai estivesse morto. Como ele não tinha morrido, o filho mais novo se cansou de manter as aparências com seu pai e pede pelas suas posses. Queria partir. O relacionamento com seu pai não importava. O surpreendente foi a atitude do pai: E o pai repartiu os bens entre eles. O pastor explicou que a palavra grega traduzida como “bens” era bios, que significa vida. Seria como quase toda a sua vida. Havia outras palavras para expressar “bens”, mas Jesus escolheu essa. No texto, bios tinha o sentido daquilo que você precisa para viver. Provavelmente aquele pai teria que vender grande parte de suas propriedades para dar a herança ao seu filho.

   Jorge continuava a ponderar em cada palavra do texto bíblico. A narrativa da trajetória do filho pródigo era bem conhecida, o fracasso dele em conseguir sua realização do seu próprio jeito, a sua volta humilhante e o contraste tremendo que Jesus expôs na postura de acolhimento do pai diante do retorno do filho. Jorge navegava em seus pensamentos tentando visualizar a cena de amor daquele pai, quando então o pastor fez uma parada na exposição:

   – Vejam que nessa primeira parte Jesus está ressaltando a gratuidade da graça de Deus. Mas agora percebam que na segunda parte veremos o preço dessa graça e o ponto alto dessa história!

   Quase que espontaneamente, Carina interrompeu a fala do pastor e perguntou:

   – Por que o filho mais velho ficou tão furioso, pastor? Para dizer a verdade, eu também ficaria indignada com a atitude do filho mais novo. Ele havia desrespeitado seu pai, gastado sua parte da herança, e agora é recebido novamente como um filho. Imagino que como filho ele voltaria a ter “direitos” na herança! Isso é justo?

    – Excelente colocação, Carina – expressou o pastor. – Vocês lembram aquele estudo que fizemos sobre o ladrão que foi crucificado com Jesus e que foi salvo no último momento?

   – Caramba, aquele estudo rendeu, hein, pastor? – expressou Toni. – Naquela ocasião muitos membros ficaram indignados com o fato de que era injusto um bandido passar a vida fazendo coisas erradas e ser salvo no último momento!

   – Bem lembrado, Toni – completou o pastor. – Aquela reação dos membros expressa que muitas vezes temos uma certa queda para o espírito do filho mais velho. Ele levava a sério a sua obediência ao pai, a ponto de dizer: “nunca transgredi um mandamento seu”. Vejam que não são os pecados explícitos do irmão mais novo que impedem o irmão mais velho de participar do convite que o pai faz para entrar e festejar no banquete. Ele nunca transgrediu as ordens do seu pai. Era justamente seu orgulho que o impedia. Não são as transgressões das regras, mas a sua retidão que o impede de partilhar do banquete do pai. Lutero expressou que o ser humano “quer alegrar-se em suas obras e adorar a si mesmo como ídolo”. O orgulho e a presunção são pecados contra o Primeiro Mandamento, expressava Lutero. Eles não roubam somente a Deus sua honra divina, mas são também um insulto ao próximo. O fariseu não peca somente contra a fé, mas também contra o amor.

    Ingride era muito inteligente, mas muito reservada. Mesmo assim, não se conteve e expressou:

   – Na verdade, pessoal, no fundo é a ideia de que somos como as pessoas boas da história! Somos bons estudantes, cidadãos, bons membros da igreja. Então, quando algo errado acontece em nossa vida, estragando nossos planos e a tentativa de ter tudo e todos sob controle, ficamos irritados, irados com Deus. Algo como se disséssemos para ele: “Não era esse o acordo, Deus! Eu sou a mocinha! O que eu fiz para merecer isso?”

   – Bem observado – expressou o pastor com grande ânimo.

   Todos ficaram bem pensativos com as palavras da Ingride. Então o pastor continuou a exposição bíblica da segunda parte da parábola, colocando algumas características do filho mais velho.

   – Vejam, irmãos, o filho mais velho queria a mesma coisa que seu irmão. Ele queria os bens, mas não queria o relacionamento com seu pai. Ao dizer que nunca desobedeceu às ordens do pai, enxergo aí uma cobrança sutil, como Ingride expressou antes. Na verdade, o coração de ambos os filhos era igual. Eles não queriam saber da autoridade do pai, queriam escapar dela. Os dois queriam estar em uma posição para dizer ao pai o que fazer. Em nossa vida também é assim. Se você não está descansando na providência de um Deus amoroso e soberano, que sabe o que está fazendo em sua vida, mesmo quando você não compreende, você estará tentando, de alguma forma, estabelecer o seu próprio governo. Como pseudosoberanos, expressou Paul Tripp, odiamos espera, desapontamentos, obstáculos e falhas. É difícil descansar no governo do Rei quando o nosso coração e mente estão preocupados com o sucesso de nossos próprios reinos pequeninos.

   – Por isso ficamos tantas vezes zangados, indignados, como aquele filho mais velho – expressou Bernardo.     – Isso mesmo, Bernardo. Vejam que todas as palavras do filho mais velho transbordam ressentimento. É um dos sintomas que se observa num espírito de filho mais velho, ou seja, quando sua vida não acontece da forma desejada. Fica-se pesaroso, com uma profunda ira e grande amargura. Outro sinal de um espírito do irmão mais velho é o medo. “Faz tantos anos que trabalho como um escravo para o senhor e nunca desobedeci a uma ordem sua”, disse ele. Mas o filho mais velho mostra que sua obediência ao pai nada mais era do que mero dever. Não há alegria nem amor, não o vemos se sentir grato por ver o pai satisfeito. Irmãos mais velhos vivem uma vida correta por causa do medo, não por alegria e amor. 

   Jorge então expressou:

   – O que eu vejo também nesse filho mais velho é a falta de certeza em relação ao amor do pai. Pois ele expressou: “O senhor nunca me deu um cabrito sequer para fazer uma festa com os meus amigos”. Não há dança nem alegria na relação do filho mais velho com seu pai.

   – Muito bom, Jorge – acrescentou o pastor. Pois enquanto alguém estiver tentando merecer a salvação por meio da tentativa de controlar Deus com suas boas ações e comportamento, jamais terá certeza de que é bom o suficiente para Deus. Simplesmente não terá certeza se Deus o ama e se rejubila com ele. Nesse contexto, vejo que um sinal muito claro dessa falta de segurança é uma vida estéril de oração. Os irmãos mais velhos podem ser disciplinados quanto ao horário das orações, mas apesar de toda religiosidade não há relacionamento pessoal, íntimo, espontâneo e prazeroso com Deus. Os irmãos mais velhos do mundo precisam desesperadamente ver o próprio reflexo no espelho. Jesus direcionou essa parábola primeiramente aos fariseus, para mostrar a eles como realmente eram e para destacar a necessidade de mudança. O filho mais novo sabia que estava distante do pai, mas o filho mais velho não sabia. E é por isso que a perdição do filho mais velho é tão perigosa. O fariseu não vai a Deus e implora pela cura da situação em que se encontra. Ele não encontra nada de errado em sua condição, e este pode ser um erro fatal.

   Naquela altura do estudo, Jorge sabia que estavam se encaminhando para o ponto alto da exposição, especialmente por causa da pergunta que o pastor fez na sequência:

   – Do que o ser humano precisa para se livrar das amarras da perdição, seja sua postura como a do filho mais novo ou mesmo a do filho mais velho?

   – Penso que a primeira coisa que precisamos é o amor acolhedor de Deus. Pois eu percebi, na parábola, que o pai vai ao encontro dos dois filhos e expressa seu amor por eles a fim de convencê-los a participarem do banquete – expressou Mikael.

   – O que é chocante – expressou o pastor – é que Jesus se dirigia aos líderes religiosos que o entregariam às autoridades romanas para ser executado. No entanto, o filho mais velho não recebe uma repreensão dura, mas uma súplica amorosa para deixar a raiva e o farisaísmo e ir festejar com eles pela volta do irmão! Além do amor acolhedor de Deus, nós precisamos também do arrependimento. Vejam que arrependimento não é levar uma lista de coisas erradas a Deus e dizer que se arrepende por cada item da lista. Não. É muito mais do que isso. Na verdade, a lista do filho mais velho seria vazia! Ele disse que nunca tinha desobedecido! Ele não enxergava seu orgulho. E como vimos antes, orgulho é o pecado contra o primeiro mandamento! O problema do filho mais velho era seu farisaísmo, o modo como ele usava seu histórico moral para colocar Deus e as outras pessoas em uma posição de dúvida e para poder controlá-los, para que fizessem o que ele desejava.

   Então o pastor deu a cartada final.

   – Há mais uma coisa de que precisamos, além do amor acolhedor de Deus e do arrependimento, a fim de participarmos do banquete de Deus. O que seria?

   A essa altura, Jorge e os demais participantes do estudo estavam totalmente absortos pelo enredo. Continuou o pastor:

   – Vemos que Jesus contou não uma, mas três parábolas aos fariseus que estavam reclamando do relacionamento de Jesus com os publicanos e pecadores. Existem semelhanças bem óbvias nas três parábolas. Vamos identificar juntos quais são elas?

   – Em cada parábola há algo perdido, a ovelha, a moeda, os filhos! – exclamou Carina.

   – Nas três parábolas, aquele que perdeu recupera o que tinha perdido e faz uma festa – expressou Toni.

   – Exatamente – confirmou o pastor. – Cada uma das parábolas termina com uma nota de júbilo festivo e de celebração quando o que se tinha perdido foi recuperado! Entretanto, há uma diferença gritante entre a terceira parábola que estamos estudando e as duas primeiras. Vocês saberiam me dizer qual é?

   Ingride arriscou uma resposta:

  – Nas duas primeiras parábolas, a pessoa que perdeu “vai atrás” e busca com dedicação pelo objeto perdido.

   – No ponto, Ingride! – elogiou com entusiasmo o pastor. – Imagino os primeiros ouvintes de Jesus ouvindo essas histórias. Eles ouviram a primeira, ouviram a segunda parábola, e ao ouvir a terceira, certamente ficaram na expectativa: “Muito bem, vamos ver quem vai em busca do filho mais novo perdido!”. Mas isso não acontece! Penso que Jesus queria que fosse assim! Imagino que Jesus queria que seus ouvintes pensassem por um instante quem iria atrás do filho mais novo perdido, uma vez que nas duas anteriores se buscou o que se havia perdido!

   – As pessoas esperavam que o pai fosse atrás? – perguntaram todos quase que ao mesmo tempo.

   – Não! – respondeu enfática e animadamente o pastor. – Quem deveria ter ido atrás era o seu irmão mais velho! É isso que um verdadeiro irmão mais velho faria. Ele teria dito ao seu pai: “Pai, meu irmão mais novo foi um tolo, e agora sua vida está toda arruinada. Mas eu vou viajar para procurá-lo, para trazê-lo de volta para casa. E mesmo que a parte dele da herança tenha terminado – o que eu imagino – vou trazê-lo para casa com o meu próprio dinheiro”.

   – Vejam, – continuou o pastor – era somente com a ajuda do irmão mais velho que o irmão mais novo conseguiria voltar. Vocês lembram que o “pai repartiu os bens entre os dois”? Tudo havia sido repartido. O filho mais novo tinha recebido um terço e gastou tudo. Dessa forma, quando o pai diz para o filho mais velho: “Tudo o que eu tenho é seu”, estava falando literalmente a verdade! Cada centavo que continuou com aquela família pertencia agora ao filho mais velho. Cada roupa, anel, cada novilho gordo era seu por direito!

   – É por isso que o senhor disse que a segunda parte fala do preço do perdão! – interferiu Débora.

   – Assim, – continuou o pastor – muitas vezes somos tentados a pensar que a readmissão do filho mais novo não envolveu qualquer sacrifício expiatório, que não teve custo algum. O filho mais novo queria fazer uma restituição, mas o pai não aceitou. Ou seja, o perdão e o amor sempre precisam ser gratuitos, a graça é incondicional. E é verdade, mas não toda a verdade. O perdão é livre e incondicional para o criminoso, mas tem um grande custo para quem o perdoa. A misericórdia e o perdão são oferecidos por Deus de forma gratuita. Se o transgressor tem de fazer algo para merecê-los, então não se trata de perdão. O perdão sempre tem um custo para a pessoa que o concede. A readmissão do filho mais novo não teve custo para ele, mas teve um custo enorme para o filho mais velho. O pai não poderia simplesmente perdoar o filho mais novo, alguém tinha de pagar a conta!

   Ingride então interrompeu o pastor e perguntou:

   – Mas por que Jesus não retratou um irmão mais velho ideal nessa parábola, um irmão que estivesse disposto a pagar qualquer preço para buscar e salvar seu irmão perdido?

   – Ingride, irmãos, – respondeu o pastor – é doloroso, em vez de um irmão, o filho mais novo tinha antes um fariseu ao seu lado. Mas nós não temos. Ao retratar o filho mais velho como o errado na história, Jesus nos convida a imaginar e desejar por um verdadeiro irmão mais velho.

   – E este, sim, nós temos – continuou o pastor. Pense no tipo de irmão de que precisamos. Precisamos de um irmão que vá não apenas ao país vizinho em nossa busca, mas de um que percorra tudo que existe por nós. Precisamos de um irmão que queira pagar não ouro e prata, mas que, a um custo infinito, com seu próprio sangue nos devolva à família de Deus, já que nossa dívida jamais conseguiríamos pagar. Seja como irmãos mais velhos, seja como irmãos mais novos, nós nos rebelamos contra o Pai. Merecemos o distanciamento de Deus (Rm 3.23), o isolamento e a rejeição. O argumento da parábola é que o perdão sempre envolve algum custo – alguém tem de pagar. Não havia meio que fizesse com que o filho mais novo retornasse à família, a menos que o mais velho assumisse esse custo. Jesus é o nosso verdadeiro irmão mais velho; ele assumiu e pagou a nossa dívida, na cruz, em nosso lugar. Nas palavras de Keller, “lá, Jesus ficou nu de suas roupas e de sua dignidade, para que pudéssemos ser cobertos com a dignidade e a importância que não merecemos. Na cruz, Jesus foi tratado como um pária para que pudéssemos ser admitidos na família de Deus, de forma livre, por meio da graça. Lá, Jesus bebeu do cálice da justiça eterna para que pudéssemos beber do cálice da alegria do Pai”. Não havia e não há outra maneira de o Pai celestial nos trazer para perto de si, a não ser às custas de nosso verdadeiro irmão mais velho.

   O estudo havia terminado, todos se despediram. Jorge estava voltando para casa em meio a ricos e iluminados pensamentos. Continuou a pensar nas várias implicações da parábola. Pensava no quanto Jesus era um expert como contador de histórias, pensava no amor incondicional do Pai, na necessidade de arrependimento da tentativa de achar nossos próprios caminhos, seja por viver segundo nossas próprias regras ou pela religiosidade vazia ou moralismo. Mas especialmente pensava no custo de nosso resgate através do verdadeiro irmão mais velho. Era o período da Epifania, e o pastor gostava de enfatizar que a graça de Deus chega aos que estão fora do povo da aliança, como ocorreu com os magos do distante oriente. Será que a presença de “irmãos mais velhos” retratados por Jesus na parábola levaria tantas pessoas a gostar de Jesus mas não gostar da igreja? Enfim, muitos pensamentos rondavam a mente de Jorge. Ele estava feliz, pois no dia seguinte iria se encontrar novamente com seu grupo para conversarem sobre as implicações práticas desse estudo, tanto para suas vidas quanto para a vida da igreja local. Isso porque as palavras finais do pastor ainda estavam ecoando em sua mente: Jamais deixaremos de ser irmãos mais novos ou irmãos mais velhos enquanto não reconhecermos nossas necessidades, pecado, enquanto não descansarmos pela fé e enquanto não admirarmos a obra de nosso verdadeiro irmão mais velho, Jesus Cristo. Se o Senhor do Universo nos amou o suficiente para suportar tudo aquilo por nós, o que eu preciso temer? – pensou Jorge...

Renato Hoerlle

Pastor da IELB em Barra do Garças, MT

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