“Meu filho (não) bebe”


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25/08/2020 #Artigos #Editora Concórdia

Tudo pode ir pelo ralo se em casa, na família, não houver diálogo franco e aberto sobre os perigos do alcoolismo e, acima de tudo, não houver o exemplo dos pais.

“Meu filho (não) bebe”

Sob o título acima, foi publicado no Jornal Zero Hora, RS, em 4 de maio de 2014, uma longa reportagem alertando sobre o problema da ingestão de bebida alcoólica pelos adolescentes. O assunto preocupa a todos, mas especialmente, pais e educadores. “Meu filho não bebe”; “Minha filha só toma um golinho”; “Ele sabe o limite”. Estas afirmações foram ditas por mães cujos filhos cumprem uma rotina de, nos fins de semana, irem para a balada. A notícia mostrou como esses adolescentes, com idades entre 13 e 15 anos, ludibriam seus pais, rotulando-os de ingênuos por desconsiderarem suas transgressões que cometem longe das vistas deles, quando saem à noite para encontrar-se com amigos em bares e danceterias. “Eles sabem que eu bebo, mas não imaginam o quanto”, foi a confissão de um deles. O Jornal mostra um retrato dos exageros frequentes nas noites de Porto Alegre, a capital que, segundo pesquisa, lidera o consumo de bebida alcoólica por adolescentes no país.

 

       Dados estatísticos            

Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada em 2013, Porto Alegre é a capital brasileira campeã no consumo de álcool entre estudantes de 13 a 15 anos do 9º ano do Ensino Fundamental. O estudo ouviu 1.455 alunos em 52 escolas.

36,7% dos entrevistados consumiram bebida alcoólica nos 30 dias anteriores.

81,9% das meninas já haviam experimentado álcool. Entre meninos, o percentual foi de 75,3%.

Em Florianópolis, a segunda colocada, o índice foi de 34,1%. Os menores percentuais foram encontrados em Belém (17,5%) e Fortaleza (17,4%). A média brasileira foi de 26,1%.

Pesquisa com 2 mil estudantes mostra como começa o consumo do álcool. O primeiro contato com o álcool e cigarro costuma ocorrer aos 13 anos.

35,3% dos alunos afirmam terem experimentado bebida pela primeira vez na casa de amigos.

Para 28,7% o gole inicial foi em casa, com pessoas do convívio diário. O consumo abusivo é mais frequente entre meninos.

70,2% deles relataram episódios de uso excessivo de bebida. 39,2% das meninas praticaram o binge drinking (beber grande quantidade em curto período) no mês anterior à pesquisa.

O que mais preocupa nesta pesquisa é que 47% dos pais nunca conversaram com os filhos, ou falaram pouco, sobre as consequências do uso de bebidas.

 

Motivos apresentados

O que leva os adolescentes a ingerir bebida alcoólica? Acredito que a curiosidade seja o principal fator. A pressão pelo primeiro gole é fator preponderante para experimentar o álcool. A reportagem cita um exemplo bem comum. Fala de uma menina chamada Giovana, que sempre foi a “certinha” da escola. Transcrevo, a seguir, uma parte da reportagem: “Enquanto os colegas aprontavam desde os 13 anos, levando doses de bebidas alcoólicas escondidas para festas em tubos de Cepacol, ela e suas amigas mais próximas se orgulhavam de não precisar beber para se divertir.

Mas à medida que o tempo passava, a curiosidade aumentava. Giovana queria entender que sensação era aquela, que fazia com que os colegas parecessem aproveitar bem mais a festa do que ela.

No final de 2013, aos 15 anos, decidiu que era hora de experimentar. A oportunidade surgiu numa formatura de oitava série. Como de costume, o pai de uma das amigas deu carona até a festa. Só que, em vez de entrarem no clube, ela e outras duas amigas se dirigiram a um posto nas redondezas. Chegando lá, compraram vodca.

- Vocês estão bebendo, não vão entrar na festa – repreendeu.

As três meninas se olharam. Chegaram a hesitar.

- Ah, mas eu já tô aqui, já fiz o que minha mãe disse para eu nunca fazer, que era sair da festa, então vou beber – raciocinou Giovana.

Ao experimentar a vodca diluída em energético, Giovana sentiu repulsa. Achou o gosto ruim.

- Não tem jeito de fazer isso mais rápido? – perguntou aos colegas que as acompanhavam.

- Só se tu tomar pura.

Giovana não teve dúvida. Virou um copo de vodca em “gute-gute”.

Enquanto bebiam na calçada, uns conhecidos passaram por ela e zombaram.

-Ih, isso aí nem pega.

Sentindo-se desafiada, Giovana virou o segundo copo.

Enquanto voltavam para o clube, começou a sentir tonturas.

-Ah, não te faz – duvidaram as amigas, que haviam bebido o destilado com energético.

Ao chegar na festa, a tontura só piorou, foi para um canto e encontrou um colega em estado parecido.”

Como terminou esta história? Conta-se que horas depois, a mãe levou um choque quando a filha abriu a porta de casa pedindo perdão.

- “A gente sempre acha que na casa da gente não vai acontecer. Mas a pressão do grupo é muito grande – constatou a mãe.”

 

Desconhecimento dos riscos

Um fato agravante é o desconhecimento dos riscos que correm esses adolescentes com a ingestão do álcool. Eles vão muito além do que um simples porre. Muitos se enganam ao pensar que os efeitos do álcool no organismo se esgotam quando acaba o porre. Diz-se que, especialmente entre os adolescentes, o risco é maior, porque nesta fase o cérebro está em um período crucial de formação – e o álcool pode comprometer esse desenvolvimento.

O risco de se tornar um alcoólatra é muito grande. De acordo com a reportagem de Zero Hora, uma pesquisa realizada pelo National Institute on Drug Abuse, dos Estados Unidos, mostrou que 15,2% dos que começam a beber aos 14 anos tendem a desenvolver o alcoolismo, enquanto que entre os que esperam até os 21 anos ou mais, o índice é de 2,1%.

O psiquiatra do Hospital de Clínicas Thiago Pianca, especialista em crianças e adolescentes, diz que a relação é química. Segundo ele, no cérebro adolescente, o córtex pré-frontal, responsável pelo autocontrole, ainda não está totalmente formado. Com o uso de álcool, pode nunca se desenvolver. Já o circuito de recompensa, associado ao prazer, está plenamente desenvolvido nesta idade.

              Como deu para perceber, não se trata de um problema qualquer, pois ao tornar-se um alcoólatra, aquele adolescente, em tão pouca idade, engrossará as fileiras dos que estarão à mercê de um vício não tão fácil de ser controlado. Isso trará grandes dores de cabeça não só para ele, mas também para seus pais, e, extensivamente, à sociedade, pois sabemos que o álcool é um dos grandes vilões causadores de mortes no trânsito. Sem falar que ele é uma das causas de desestrutura familiar, e seu consumo em excesso é prejudicial à saúde.

 

          Medidas preventivas

              É preciso tomar algumas medidas de prevenção. Proibir os adolescentes de ir à balada e de experimentar o primeiro gole é a melhor solução? Talvez, não. É sempre bom lembrar que quanto mais se proíbe, mais desafiados e seduzidos estarão a desobedecer e a fazer a primeira experiência. 

              Infelizmente, vivemos numa época em que a maioria das pessoas pensa que a Palavra Deus precisa se adequar aos tempos pós-modernos, de novos costumes e novas ideologias, quando é totalmente o inverso. Largar-se um pouco não faz mal a ninguém, dizem. O apóstolo Paulo nos recomenda dizendo: “E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (Rm 12.2).

              Por isso, buscar a orientação em Deus e sua Palavra é imprescindível para a boa formação cristã dos adolescentes e jovens. A Igreja precisa estar atenta e oferecer um bom programa de educação e orientação cristã para eles. Isto já começa na escola dominical, ensinando os pequeninos a amar e a respeitar a Deus (Pv 22.6; 2Tm 3.15), a conhecer cada vez melhor o Salvador Jesus, sua vontade e seu amor. A sequência do ensino é a Instrução de Confirmandos que, a meu ver, não pode ser negligenciada ou realizada de qualquer jeito só para cumprir uma agenda. Todavia, esta precisa ser tomada muito a sério, pois é ali, com seu pastor, que os adolescentes poderão se aprofundar de maneira mais sólida nos ensinos bíblicos cristãos. Tendo uma boa base bíblica, certamente terão prazer em participar da união juvenil, onde se construirá uma boa liderança leiga.

              Entretanto, tudo isso pode ir pelo ralo se em casa, na família, não houver diálogo franco e aberto sobre os perigos do alcoolismo e, acima de tudo, não houver o exemplo dos pais. Estes precisam tomar as rédeas nas mãos, pois se não ensinarem a seus filhos bons valores éticos e cristãos, o mundo se encarregará de fazê-lo a seu modo, o que será muito doloroso. É preciso dedicar tempo para estar mais junto deles, especialmente não descuidar dos momentos devocionais em família; orar junto com eles e por eles. É importante saber com quem o filho anda, conhecer seus amigos, seus costumes, determinar a que horas deve estar de volta em casa, cuidar o que anda vendo na Internet, ou seja, estabelecer disciplina e limites. Sabemos, no entanto, que isso não é tarefa fácil; o que sabemos é que Deus prometeu dar forças e coragem para criarmos e educarmos nossos filhos em seus caminhos. E prometeu estar sempre com seus queridos e amados filhos, por quem entregou seu Filho amado para nos dar o perdão dos nossos pecados, vida e salvação. Em seus meios da graça, Palavra e Sacramentos, encontramos a força necessária para cumprir nossa missão de pais e educadores cristãos.

Que Deus abençoe a todos ricamente!

 

                                                                                     Argentino Hélio Ahnert

                                                                                     Pastor na Congregação Cristo Redentor de Viamão, RS

*Texto publicado na edição de agosto de 2014 do Mensageiro Luterano.

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