O nosso ministério durante sete anos na Cidade do
Cabo, África do Sul, foi uma experiência tão extraordinária, que eu costumava
dizer que era a cerejinha em cima do sorvete, “the cherry on top of the ice cream
sundae”, significando que era a culminância de uma carreira.
Depois fiquei pensando nessa comparação e tentei
analisar o meu ministério desde o começo, como se fosse um sorvete. Para
começar, adoro sorvete e adoro meu ministério. Sempre agradeço a Deus que me
chamou para esse serviço e me abençoou ricamente durante os 48 anos de
ministério ativo.
O começo, realmente, foi no Seminário. Ali foi
preparado o cone para colocar o sorvete. Meu amigo e bispo Dieter Reinstorf me
disse certa vez que “todos nós fomos moldados por nossos professores”. Eu tinha
11 anos quando fui para o internato do então pré-seminário em Porto Alegre, RS.
E estudei lá durante 11 anos: quatro anos de ginásio, três anos de colégio, e
quatro anos de teologia. Foi bastante tempo para a casca ser moldada e preparada
para assumir suas responsabilidades. As aulas, o convívio com os colegas, o
exemplo e o ensino dos professores; a participação nas comunidades como
professor de Escola Dominical e líder na juventude; o Coro Orfeônico do
Seminário... enfim, tudo colaborou para formar a base daquele que entrou
pré-adolescente e saiu homem feito daquela instituição. A casca do sorvete
estava pronta.
Meu primeiro chamado foi para São Paulo, capital,
trabalhando como pastor auxiliar na “Concórdia” de Indianópolis e na missão em Rio
Bonito/Interlagos. Depois também na Hora Luterana, foi a primeira bola de
sorvete, talvez uma bola de chocolate, a começar a preencher o cone do sorvete.
Muita experiência boa foi colhida e lembranças inesquecíveis permanecem. Como
disse o pastor Ernesto Heine por ocasião da inauguração da igreja em
Interlagos: “Este é o primeiro amor do pastor Walter”. Foram 15 anos de
bênçãos.
Depois recebi o chamado da “Concórdia” de Porto
Alegre. Jamais sonhara voltar para o sul do país; mas o chamado é divino e
aceitei com alegria. Foram 10 anos de experiências, convívio, liderança, e de onde
guardo muitos amigos ainda, como em todos os lugares por onde passei. Foi a
segunda bola de sorvete, talvez de baunilha...
A terceira bola foi de sorvete de menta, um pouco
picante: a presidência da Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB). Foram
oito anos de desafios e alegrias, decisões e decepções, oportunidades e contatos
nacionais e internacionais. Deus foi muito gracioso, colocando à minha volta
equipes de apoio fabulosas. Os problemas normais que tive que enfrentar não
superaram as alegrias e oportunidades que tive.
Totalmente inesperado, veio o chamado para Nairóbi, no
Quênia. Minha esposa Lídia e eu aceitamos sem titubear. Não conhecendo o que
nos esperava, enfrentamos o desconhecido com fé em Deus, sem duvidar de que ele
nos queria lá. Uma amiga nos deu um cartão, que guardo na minha Bíblia até
hoje; ela escreveu: “... e partiu sem saber aonde ia” (Hebreus 11.8). Queridos Winterle e Lídia, pela fé vocês estão indo como Abrão foi. Que
Deus vos dê fé, sabedoria e coragem. Que Deus vos abençoe...”. As oportunidades
de servir foram muitas, tanto na congregação principal no centro da cidade,
como nas duas congregações no meio de grandes favelas. Junto com a liderança
local, tivemos a alegria de fazer muito serviço social, especialmente com
órfãos do HIV/AIDS. Voltando à minha analogia do sorvete, diria que o trabalho
no Quênia foi o chantili por cima do sorvete. Além do trabalho ministerial,
ganhamos como bônus a possibilidade de fazer vários safáris, conhecendo a vida
selvagem como ela realmente é. Recebemos a visita de nossos filhos e de amigos,
com quem pudemos compartilhar este bônus. Foram quatro anos inesquecíveis!
Acrescentando um pouco de confeito de chocolate ao
chantili, foi do Quênia que eu tive a oportunidade de começar o trabalho da
Educação Teológica por Extensão – ETE em Moçambique. Foi amor à primeira vista,
e Deus tem abençoado muito o trabalho de Educação Teológica e de Missão naquele
país até hoje. Mesmo aposentado/emérito, me coloquei à disposição para
continuar coordenando o trabalho de Moçambique.
Gostamos tanto da África, que nossa oração era: Se
Deus quiser, queremos ficar na África. Foi quando veio, em resposta às nossas
orações, o chamado para a Cidade do Cabo. Considerada uma das cidades mais
bonitas do mundo, desfrutamos das belezas, visitamos lugares belíssimos, e
deixamos muita saudade por lá. A pequena Congregação St. Thomas foi calorosa no
nosso acolhimento e apoio durante os sete anos de ministério. Sem muita
pressão, tive bastante tempo para me dedicar à Congregação e a Moçambique, para
ler e estudar. As visitas dos filhos e netos, e de amigos, nos encheram de
muita alegria. Por isso considero o ministério na Cidade do Cabo como a
cerejinha no topo do sorvete.
Quando pensei que estava na hora de me aposentar, aos 67
anos, veio o chamado para o Seminário Teológico Luterano em Pretória, África do
Sul. Relutei um pouco em aceitar o chamado/contrato de três anos. Mas as duas
igrejas e a Sociedade Missionária mantenedoras do Seminário queriam minha
experiência para reorganizar o Seminário. Aceitei. Continuando minha analogia
do sorvete, o Seminário literalmente “comeu” parte do meu sorvete. Foi uma
tarefa difícil, mas compensadora. Além da administração, as aulas e o trato com
os alunos de diferentes origens, culturas e países sugou bastante da minha
energia. Não me queixo, mas agradeço a Deus que me deu forças e sabedoria para
levar o Seminário a uma situação estável, repassando as tarefas ao novo reitor
com a sensação de dever cumprido.
O que restou do sorvete vou desfrutar durante os anos
que Deus ainda me conceder como pastor emérito. Quero escrever, traduzir,
revisar; quero apoiar e coordenar o trabalho em Moçambique enquanto tiver
condições, compartilhando com os irmãos o conteúdo do “sorvete” acumulado
durante a vida.
Talvez algum colega compararia o seu ministério com
uma comida mais picante, ou com um churrasco, às vezes, mais picanha, outras,
mais costela... Mas eu levei o ministério numa boa, como um sorvete gostoso,
mas também com toda a seriedade e responsabilidade; e sempre confiando que “a
nossa suficiência vem de Deus” (2Co 3.5), que foi o lema de minha formatura e é
o lema de todo o meu ministério. A Deus toda a glória, e aos irmãos,
principalmente os membros das congregações que servi, nossa gratidão por todo o
apoio, amizade e amor, demonstrados até hoje.
Estamos de volta ao Brasil
Desde o começo de fevereiro, minha esposa e eu estamos
de volta ao Brasil, após servir ao Senhor durante 14 anos na África.
Entro no rol de Pastores Eméritos da Igreja Evangélica
Luterana do Brasil – IELB, mas continuo responsável pela missão em Moçambique,
sendo o pastor André Plamer, responsável pela ETE. Por enquanto estamos
impedidos de ir para lá devido à situação imposta pela Covid-19; mas
continuamos em contato permanente com a liderança da Igreja Cristã da Concórdia
de Moçambique (ICCM) através de e-mails, WhatsApp e ligações telefônicas, dando
as devidas orientações e supervisionando o trabalho e os projetos em andamento.
Fixamos residência em minha cidade natal, Santa Cruz
do Sul, RS, de onde saí com 11 anos para estudar no pré-seminário, e para onde só
voltava de vez em quando para visitar meus pais e meus irmãos. Hoje ainda tenho
duas irmãs morando aqui, um cunhado e uma cunhada, e vários sobrinhos, que nos
estão dando grande apoio neste momento de adaptação à nova realidade.
Agradeço a Deus pelos 48 anos de ministério ativo, e
peço forças e saúde para continuar servindo à missão de Deus em Moçambique, nem
que seja só de longe. Mas se Deus quiser, ainda gostaria de voltar lá para a
conclusão do curso, formatura e ordenação da segunda turma de pastores.
Agradeço o apoio e o carinho de tantos amigos de
várias partes do mundo, especialmente durante estes últimos anos na África. Foi
uma experiência incrível!
Agradeço à minha esposa, que me acompanhou nesta
jornada, sempre me dando o apoio necessário. Voltar para casa após um dia de
trabalho ou uma viagem era como voltar a um porto tranquilo para recuperar as
forças.
Nosso endereço e contatos: Carlos Walter
e Lídia Winterle
Rua Tenente Coronel Brito 220/403, Santa Cruz do Sul,
RS
CEP: 96810-202
Telefone
(WhatsApp): +55 51 99180-1162
E-mail:
cwwinterle@gmail.com
Pastor Carlos Walter e Lídia Winterle
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