A igreja recebe o que precisa para a missão de levar Cristo para todos
Lucas começa a
narrativa do evangelho com referência a um tempo histórico: nos dias de Herodes, rei da Judeia(Lc
1.5), enquanto a narrativa de seu segundo livro começa com a pergunta sobre um
outro tipo de tempo, o tempo profético: Senhor, será este o tempo em que
restaures o reino a Israel?(At 1.6).
O primeiro e segundo livro de Lucas correspondem, no
calendário litúrgico, respectivamente ao período do Advento até Pentecostes, e, do Pentecostes até o Advento. O primeiro tempo é dedicado ao ministério de Jesus. O
segundo, à missão da igreja. Na primeira metade do ano litúrgico, comemoramos o
Natal, Epifania, Transfiguração,Domingo de Ramos, Crucificação,
Páscoa, Ascensão e Pentecostes. Na
segunda parte, o tempo chamado comum ou tempo da igreja.
O
domingo de Pentecostes, assim como o primeiro domingo de Advento, são o
fim de um ciclo e o início do outro. São datas litúrgicas que marcam dois
tempos, o começo e o fim. E a cada data corresponde um grupo de pessoas, que
correspondem à esperança de Israel, antes e depois do cumprimento da promessa
de salvação.
O
primeiro grupo era formado por mulheres e homens que, com fidelidade, esperavam
a vinda do Salvador, filho de Davi. Entre estes estavam Isabel e
Zacarias, pais de João Batista; Maria e José; além de dois idosos, quase
centenários: Ana e Simeão.São estas as pessoas que Lucas menciona como aquelas a quem Deus revelou, antes e logo
depois do nascimento de Jesus, que ele era o Salvador prometido. Mateus
menciona os magos do Oriente.
O segundo
grupo era também formado por mulheres, a exemplo de Maria, mãe de Jesus, e
homens, especialmente os apóstolos.No
total, eram 120 discípulos de Cristo que estavam reunidos em Jerusalém. Paulo
fala de 500 discípulos reunidos na Galileia, provavelmente antes do Pentecostes.
A única
pessoa que é mencionada nos dois grupos, no início do evangelho e no início de
Atos dos Apóstolos, é Maria, mãe de Jesus. No evangelho, Maria e José. Nos Atos
dos Apóstolos, Maria e os irmãos de Jesus. O destaque que Lucas dá a Maria, no
início do segundo livro, o dos Atos dos Apóstolos, remete o leitor ao início do
primeiro livro, o evangelho. O Pentecostes remete ao Advento, e este,
de volta ao Pentecostes.
Maria, no primeiro livro, recebe a promessa: Descerá
sobre ti o Espírito Santo (Lc 1.35), e Maria, de novo,
como uma dentre outras tantas mulheres, está entre aqueles a quem o
Ressuscitado prometeu: recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito
Santo, e sereis minhas testemunhas (At 1.8).As duas promessas respondem, a primeira, à
pergunta de Maria ao anjo, e a segunda, à pergunta dos apóstolos a Cristo.
Nos dois relatos está presente o tema da
restauração do reino segundo a promessa divina por meio dos profetas (2Sm 12-17; Isaías 9.6,7). Quando Pilatos perguntou se de fato Jesus
era rei, ele respondeu: O meu reino não é deste mundo... o meu reino não é daqui... [mas] Para isso nasci e para isso
vim ao mundo [para ser rei], a fim de dar testemunho da verdade (Jo 18.36,37).
Os fiéis do início do evangelho são
apresentados por Lucas como aqueles que que esperavam a consolação de Israel e a redenção de Jerusalém (Lc 2.25-38),
exatamente o que esperavam os discípulos de Jesus no início do livro de Atos
dos Apóstolos: será este o tempo em que restaures o reino a Israel (At 1.6).
O tempo da
restauração do reino, a dádiva do Espírito Santo e o testemunho são os pontos
em comum nas narrativas do nascimento de Jesus e no relato da ascensão de
Jesus.No evangelho, contudo, a narrativa está assentada
na profecia de Isaías: e o seu reinado não terá fim (Lc 1.33; Is 9.7). Já em Atos dos Apóstolos, o contraponto da
narrativa é a profecia de Joel: antes que venha o grande e
glorioso Dia do Senhor (At 2.20; Jl 2.31).
A
pergunta de Maria (Lc 1.34) e a dos discípulos (At 1.6) têm, ainda, em
comum, que ambas demonstram a perplexidade humana diante do modo de agir de
Deus. Ambas as perguntas, por essa mesma razão, recebem como resposta não uma
explicação racional do modo de ação de Deus, mas a promessa da descida ou
derramamento do Espírito Santo (Lc 1.35 e At 1.8).No evangelho de João, temos a promessa
de Jesus aos discípulos: o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome,
esse vos ensinará todas as coisas(Jo 14.26).
As
narrativas de Atos dos Apóstolos, em que a missão de Pedro e de Paulo,
especialmente, mas também de Estevão, Felipe, Barnabé e Tiago, são exemplos que
correspondem, no evangelho, aos testemunhos, especialmente, de Isabel e
Zacarias – pais de João Batista, de Maria, de Ana e Simeão. Cheios do Espírito
Santo, todos dão testemunho da ação salvadora de Deus.No evangelho, são alguns apenas.Nos Atos dos Apóstolos não são apenas os doze
apóstolos, mas os cento e vinte discípulos reunidos no dia de Pentecoste, e
todos os que atenderam ao chamado e promessa do evangelho: Crê no Senhor
Jesus e serás salvo, tu e tua casa(At 16.31).
Um novo
tempo começa no Pentecostes, já não estão
presentes Isabel e Zacarias, José, Ana e Simeão. Maria está, com
os irmãos do Senhor.E destes, somente Tiago é mencionado
novamente em Atos dos Apóstolos.Tiago, irmão de
Jesus, se torna o líder da igreja em Jerusalém depois da perseguição do rei
Agripa I.Lucas menciona Tiago como um dos que
estavam em Jerusalém no Pentecostes.
E novo tempo
é o anunciado pelo profeta Joel, que começa com o Pentecostes e termina com o Dia do Senhor (juízo). A resposta de Jesus aos
discípulos está no marco da profecia de Joel: um tempo que começa com o
derramamento do Espírito e que termina com o dia do juízo, e que é um tempo de
pregação do evangelho.
O novo tempo começa com o Pentecostes: E acontecerá... que derramarei o meu Espírito sobre
toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão; e termina com oJuízo final: o grande e terrível Dia do SENHOR. Entre um e outro tempo, a igreja anuncia o evangelho de Cristo: E
acontecerá que todo aquele que invocar o nome do SENHOR será salvo (At 2.16-21; Jl 2.28-32).
O
Pentecostes é o tempo da graça ou o tempo oportuno (Hb 4.16). O Pentecostes é o tempo único na história humana, o tempo
em que no Senhor, o vosso trabalho não é vão (1Co 15.58).Pregar o evangelho de Cristo ao mundo é fazer
a obra do reino eterno, que jamais deixará de existir. O resto, tudo, é
vaidade, é vão. Por mais importantes que sejam, são deste mundo (deste século).
O reino de Cristo é do mundo (do século) vindouro.
Os
discípulos esperavam, com sinceridade, a restauração do reino de Deus, e Jesus
lhes mostrou que o reino de Deus, nesta vida, experimentamos por meio do testemunho: e não há salvação em nenhum outro; porque abaixo
do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens,
pelo qual importa que sejamos salvos (At 4.12).
A
restauração do reino de Deus, nesta vida, se dá no coração e nos frutos
(palavras e ações). É restauração interior, sim, obra do Espírito Santo, pelo
testemunho ou pregação do evangelho de Cristo. Não é, contudo, restauração de
coisas vãs, mas a restauração da nossa vida com Deus.
No último
versículo de Atos dos Apóstolos, temos o modelo de missão da igreja que é
guiada pelo Espírito Santo.Paulo,
confinado em uma casa em Roma, aguardando o julgamento de César, pregava o reino de Deus e ensinava as coisas referentes ao Senhor Jesus Cristo (At 28.31).
A
restauração em glória do reino de Deus acontecerá em tempos ou épocas que o
Pai reservou para sua exclusiva autoridade (At 1.7), nossa
missão é o testemunho até os confins da terra (At 1.8).
Pentecostes
é o início da missão, testemunho e pregação do evangelho a toda criatura e
todas as nações (Mc 16.15; Mt 28.19). E essa missão,
testemunho e pregação não cessará até a vinda do Senhor.
No
Pentecostes, a igreja anuncia a todos, sem distinção: para vós outros
é a promessa, para vossos filhos e para todos os que ainda estão longe, isto é,
para quantos o Senhor nosso Deus, chamar (At 2.39; Ef 2.17; Is
57.19).
E
damos nosso testemunho sem duvidar, porque não falamos em palavras
ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinadas pelo Espírito de Deus (1Co 2.13 [11]).E nosso
trabalho não é vão, nem nos envergonhará – isto é, não deixará de dar frutos
para a eternidade, porque o evangelho de Cristo époder
de Deus para a salvação de todo aquele que crê (Rm
1.16).
Pentecostes
é tempo de restaurar o reino de Deus nos corações de todos pela pregação do
evangelho, antes que venha o dia da restauração de todas as coisas segundo a
vontade de Deus. Pentecostes é graça, antes que
venha o juízo de Deus sobre a terra. Pentecostes é o poder
do Espírito Santo derramado sobre a igreja para o anúncio do evangelho de
Cristo ao mundo.
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